Dia das Domésticas – Todo dia é dia delas

“Graxeira, não! Eu gosto da nova “secretária do lar”. Nosso dia está aí e as coisas não estão lá essas coisas”. Herika Santos de Jesus, 20, mãe de um filho de um ano e seis meses, reza para ter um novo emprego na fila de espera no centro de apoio Casa da Doméstica, mas não é religiosa como o sobrenome.

Começou cedo e já passou por cinco casas, sempre “cobrindo” as amigas que ficavam de folga. Nesse dia 27, quando é comemorado o Dia das Domésticas, Herika e tantas outras esperam que melhores condições possam surgir nos próximos dias de faxina. Mas o encontro diário com o desprezo vai apagando o sonho.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, são concedidos direitos sociais aos (as) empregados(as) domésticos (as), como: salário mínimo; irredutibilidade salarial; repouso semanal remunerado; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, 1/3 a mais do que o salário normal; licença à gestante, sem prejuízos do emprego e do salário, com duração de 120 dias; licença-paternidade; aviso prévio ; aposentadoria e integração à Previdência Social.

Ana Gardênia
De todos os pontos legais, Ana Gardênia Rodrigues Lima, “sergipaníssima, desquitada, e mãe de três filhos”, já camuflou todos por necessidade. “O mundo não é fruto de perfeição. Infelizmente tenho que dizer: junte cem patrões, sobram no máximo dez que valorizem nosso trabalho”, lamenta.

Dos três filhos, um é mulher, e Ana não quer que ela seja doméstica. “São mais de 20 anos de estrada. Conheci muita gente louca nessa vida. Certa vez, em Belo Horizonte, fui chamada para trabalhar num convento chamado São Sebastião Batista. As freiras não tinham nada de boazinhas. Logo no primeiro dia, numa segunda-feira, elas derramaram na área de lavagem de roupas, 50 peças. Eu saí tonta sem acreditar como é que elas sujavam tanta roupa”, conta.

Para piorar a situação, na terça, Ana se surpreendeu com a união entre roupas das freiras com as noviças. “Era uma montanha de roupa. Teve uma vez que sentei na calçada quando eu estava indo embora. Não via a hora de que no dia seguinte fosse mais leve”, diz.

Mas não foi como ela esperava. “Quando chego lá no local, a freira que tinha me chamado pra trabalhar disse que agora eu somente iria limpar o setor das noviças. “Esmola demais…”. Eu ganhava meio salário, e passaria a ganhar um inteiro. Justamente na quarta-feira levei uma queda no chão molhado, fiquei sem poder andar por uns dias, e fui demitida na mesma semana”, explica.

Para piorar ainda mais a vida dela, a mesma freira que tinha contratado deu uma colher de chá meio amargo. Na semana seguinte, ela escutou da religiosa: “Você vai para a casa de uma parente minha. Ela é idosa, mas não se preocupe. É tranqüilo”.

No dia em que chega para fazer o serviço na casa da Dona Cândida, Ana se depara com uma montanha de lixo. “Eu nunca tinha visto aquilo na minha vida. A casa tinha dois quartos e duas salas grandes. Tinha lixo em todos os cômodos. Demorei exatas duas semanas pra retirar toda a sujeira”, diz.

Ela revela alguns segredos que poucos na família da idosa sabiam. De acordo com Gardênia, a Dona Cândida tinha hábitos surpreendentes. “No tempo em que passei tentando retirar toda sujeira da casa, descobri quatro escrituras de apartamentos. Ela tinha muita grana. E o pior que certa vez a vi numa porta de uma clínica mendigando comida das funcionárias”, expõe.

Josileine Joaquim dos Santos, “Jô”
Os problemas continuam

De acordo com a presidenta da Casa da Doméstica, Eliana Santana Barreto, a categoria bate na mesma tecla há anos: a falta dos diretos trabalhistas. “Elas chegam aqui e o discurso é o mesmo. O sindicato, órgão em que temos bastante aproximação, está em Brasília discutindo com ministros e outros sindicatos nacionais, em busca de novas medidas a serem aplicadas para que a classe tenha realmente uma nova realidade”, explica.

Um exemplo, muita vezes vergonhoso para as trabalhadoras, toca na questão do assédio sexual. Com 23 anos de estrada, Josileine Joaquim dos Santos, a Jô, conheceu dias que ficaram na memória. “Trabalhei durante 15 dias com um casal em Recife. Ele passava mais tempo em casa do que a mulher. Certa vez estava na cozinha e percebi que alguém se aproximava. Quando estava virando para olhar, “ele” me agarrou por trás e tentou “algo a mais”. Não deixei. Por incrível que pareça, a esposa chegou no mesmo momento”, relata.

Constrangida, Josileine comentou com a “patroa” sobre o incidente. “Ela reagiu calmamente. Aparentava que era tudo acertado. Como um teste para saber se eu apoiava esse desrespeito. Pedi minhas contas na hora”, descreve.

No que tange relação entre empregador e empregado, Eliana Barreto coloca que esse é o segundo maior ponto de discussão. “Dentro das aproximadamente 10 mil domésticas cadastradas na nossa entidade, as relações interpessoais entre ambos sempre está em pauta na reuniões. Primeiro vem os direitos, segundo a educação”, finaliza.

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