Cidadão Mank

Liliane Costa Andrade

Doutoranda em História Comparada (PPGH/UFRJ)

Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)

E-mail: liliane@getempo.org

Cartaz de divulgação do filme Mank. Fonte: https://www.adorocinema.com/filmes/filme-275554/

Dirigido por David Fincher, Mank é um filme produzido pela Netflix, lançado em 04 de dezembro de 2020. Com duração de 2h12min, a película, que mescla os gêneros biografia e drama, filmada em preto e branco, retrata o processo de produção do roteiro de Cidadão Kane, considerado um dos principais filmes da história de Hollywood.

Ambientada na década de 1930 e início da década de 1940, a trama se desenrola a partir da vivência de Herman J. Mankiewicz, mais conhecido como Mank. Em 1940, o então roteirista hollywoodiano, que sofria com problemas de alcoolismo, sofre um acidente de carro; no hospital, recebe a visita de Orson Wells, recém-contratado da RKO Radio Pictures. Aos 24 anos de idade, com autonomia absoluta para a criação de filmes de qualquer tipo e assunto, e, trabalhando com a equipe que desejasse, Wells estabelece um acordo com Mank.

Após receber alta hospitalar, o roteirista é enviado ao “Rancho North Verde”, na companhia de uma enfermeira, para ajudar a cuidar do seu estado de saúde, e de uma datilógrafa. Em um prazo de 60 dias, Mank deveria elaborar o roteiro de uma nova película, que viria se chamar Cidadão Kane. Tendo todas as suas despesas pagas por Wells, Mank, num primeiro momento, aceitou abrir mão dos créditos da história que iria criar.

Ao mesmo tempo que retrata o conturbado processo de elaboração do referido roteiro, a película dirigida por Fincher revisita eventos passados vivenciados por Mank, a partir do emprego de flashbacks. Em cada um deles, o telespectador é conduzido aos bastidores da indústria cinematográfica hollywoodiana ao longo da década de 1930, influenciada por diversos acontecimentos, como a Grande Depressão (1929).

Considerada uma das maiores crises econômicas da história, a quebra da bolsa de valores de Nova York afetou diretamente o mercado cinematográfico do período, impondo dificuldades às grandes produtoras, como a Metro-Goldwyn-Mayer (MGM), para a qual Mank passou a trabalhar após sua saída da Paramount.

Em um flashback que se passa em 1933, durante o aniversário de Louis B. Mayer, então presidente da MGM, outros acontecimentos cruciais para o período foram levantados durante uma conversa. O primeiro deles foi a atuação de Adolf Hitler e do partido nazista, que àquela altura já inaugurava os primeiros campos de concentração e promovia a queima de livros. Enquanto Mank demonstrava preocupação com os eventos, Louis B. Mayer defendia que Hitler não deveria ser levado a sério. O motivo? Não se poderia ignorar o lucrativo mercado de cinema alemão; de fato, a MGM foi uma das últimas produtoras a romper com o regime nazista.

Se, em prol do lucro, as atitudes de Hitler deveriam ser ignoradas, com relação ao socialismo o posicionamento de Mayer foi o oposto. Preocupado com as ideologias pregadas por esse modelo político, o magnata da maior indústria cinematográfica do mundo usou seu poder para influenciar as eleições do governo da Califórnia, ocorridas em 1934.

Em mais um flashback, as memórias de Mank nos mostram como o cinema foi usado para fins políticos. Durante a campanha eleitoral, travada por Frank Merriam (Partido Republicano) e Upton Sinclair (Partido Democrata), a MGM patrocinou, às escondidas, a produção de cinejornais que buscavam manipular a opinião dos eleitores em favor do candidato republicano. Após a votação, Sincalir atribuiu aos filmes o motivo da sua derrota. Quem também perdeu foi Mank, que chegou a apostar no candidato democrata.

Além dos aspectos políticos, a película também nos mostra os bastidores das gravações de um filme que estava sendo produzido pela Metro. Nesse momento, é possível observamos características técnicas relativas à produção cinematográfica, como o emprego da “panorâmica”, um dos movimentos de câmera utilizados no cinema. Além disso, claro, Mank toca em questões referentes ao processo criativo da história de uma película.

Com a ajuda de bebidas alcóolicas, Herman J. Mankiewicz entrega, contendo mais de trezentas páginas, o roteiro de Cidadão Kane. O filme foi lançado em 16 de junho de 1941. No Oscar de 1942, foi indicado em nove categorias, vencendo em apenas uma: melhor roteiro original. O prêmio foi dividido entre Herman J. Mankiewicz e Orson Wells, apesar de Mankiewicz ter garantido que escreveu o roteiro sozinho. Em 2021, com Mank, essa história retorna à maior premiação da indústria cinematográfica com a indicação em dez categorias; dentre elas, a de “Melhor Filme”. Quantas estatuetas uma das maiores polêmicas de Hollywood renderá aos envolvidos na sua produção? Saberemos no próximo domingo (25/04).

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais